sábado, 25 de agosto de 2012

SUBSIDIOS PARA A HISTÓRIA DA CORPORAÇÃO DE PILOTOS DA BARRA DO DOURO E PORTO ARTIFICIAL DE LEIXÕES – Episódio 249

A FAMOSA BARCA PORTUGUESA “FOZ DO DOURO” DEMANDA PELA PRIMEIRA VEZ O PORTO DE LEIXÕES

A barca FOZ DO DOURO / autor não identificado - O Século Ilustrado /.

Rebocador BRAGANÇA em aprestamentos finais junto da carreira da Parceria Marítima do Douro / foto da PMD /.

A 11/09/1943, manhã cedo, a estação semafórica do Monte da Luz comunicava que a barca à vela, de quatro mastros, FOZ DO DOURO, procedente de Lisboa, estava à vista, a sudoeste, e sendo assim, o rebocador BRAGANÇA, ex LUSITÂNIA, apressou-se a ir ao seu encontro, a fim de a pegar à proa para a conduzir ao porto de Leixões. Às 09h30, ambas as embarcações demandaram o porto de Leixões, indo de imediato atracar ao cais acostável do Molhe Sul. A 18, após ter carregado carga geral, cruzou os molhes assistida pelo mesmo rebocador, o qual largou a amarreta a cerca de três milhas da costa e de pano todo largo, aproveitando o vento de feição de nordeste, que se fazia sentir, tomou o rumo de sudoeste, com destino aos portos Brasileiros de Rio de Janeiro e Santos. A FOZ DO DOURO escalou o porto de Leixões por várias vezes, quer como barca ou já como navio-motor, e eu ainda me recordo de numa segunda escala, atracada na doca nº 1- norte, ter estado a bordo dela, pela mão de meu pai, que fora visitar o contra-mestre, seu camarada dos tempos de tropa, no quartel de Minas e Torpedos Fixos de Paço de Arcos.

A barca FOZ DO DOURO ostentando a pintura própria da sua nacionalidade neutral durante a guerra / autor não identificado - colecção F. Cabral, Porto /.

FOZ DO DOURO – imo 2096496, foi uma das últimas unidades mercantes matriculadas na praça do Porto, adquirida em 1942, pelo armador Portuense Júlio Ribeiro Campos, que era natural e residente da freguesia da Foz do Douro.
Era um puro navio de velas, cujo aparelho armava em barca de quatro mastros, com 88,2m/2.345tb, construído em aço e lançado à água pelo estaleiro C. Connel & Co., Glasgow, em 02/1892, com o nome de HAWAIAN ISLES, e foi utilizado pelo seu primeiro armador Hawaian Construction  Co., Honolulu, no transporte de açúcar entre as ilhas do Hawai e a costa oeste da América Latina.
Entre 1893 e 1926, a barca esteve ao serviço de vários armadores, entre os quais a Alaska Packer’s Association, San Francisco, Califórnia, que lhe deu o nome de STAR OF GREENLAND, tendo sido desactivada em 1926 em Alameda, Califórnia, mas em 1929 foi adquirida pela fundação Stiftelsen Abraham Rydberg, Estocolmo, passando a servir como navio-escola da marinha mercante Sueca, com o nome de ABRAHAM  RYDBERG (III), transportando carga e treinando futuros marinheiros e pilotos náuticos, e, em 1930, navegou de São Francisco para Inglaterra com um carregamento completo de cereal a granel, levando 124 dias de viagem.

A barca escola ABRAHAM RYDBERG (III) correndo ao tempo / autor não identificado /.

A 10/05/1936, teve uma colisão com o vapor Inglês KORANTON, 126m/6.695tb, do armador R. Chapman & Co., Newcastle, a 45 milhas a sul de Eddystone, na costa meridional Britânica, tendo ficado com várias chapas do costado de bombordo amolgadas e perdido o mastro do contra-traquete, pelo que foi levada para um estaleiro do Blyth, onde sofreu reparações. 
Quando rebentou a guerra de 1939/45 a ABRAHAM  RYDBERG (III), navegava da América do Sul para a Europa, e então avisada da situação ruma aos E.U.A. e até 03/1942 passou a operar no tráfego entre a América do Norte e a costa leste da América do Sul. Em 15/03/1942 encontrava-se em Baltimore e mais uma vez foi desactivada.
Em 05/1943, Júlio Ribeiro Campos, seu novo armador, trouxe a barca para Portugal, ficando registada na capitania do porto do Porto a 17/06/1943, sob o nome de FOZ DO DOURO, e então, ainda como navio de carga, retoma o tráfego comercial, realizando viagens ao Brasil e outros portos do globo, transportando carga geral, cereais, algodão ou açúcar.
Em 21/12/1943, inicia uma célebre viagem, que tem como passageiro convidado o distinto aeronauta e cientista, que foi o almirante Gago Coutinho, com partida de Santos e chegada Leixões em 31/03/1944, com 105 dias de viagem, 103 dos quais sem vislumbrar terra. Foi uma rota primitiva de características especiais, num largo S devido aos ventos dominantes do Atlântico Sul, navegando 8.740 milhas, mais do dobro da distância directa entre os dois portos, só se tendo avistado apenas três vapores e foi sobrevoada por alguns aviões de patrulha devido à situação de guerra mundial.
A FOZ DO DOURO era comandada pelo velho homem do mar, que foi João Fernando Agualusa, com quase tantos anos de travessia do Atlântico como os que a barca contava de existência, e tinha como oficiais subalternos os capitães Domingos Magano e Fernando Macias. Utilizando o velho astrolábio dos navegadores do século XV, Gago Coutinho fazia todos os dias as medições astronómicas ao lado dos pilotos do navio, que se serviam dos modernos aparelhos, como o sextante e o cronómetro, podendo assim apreciar bem o valor prático do velho instrumento de marear.
A barca viria a sofrer, em 1944 e 1945, novas e profundas alterações no estaleiro de Kensington, Filadélfia, que terão contribuído para um melhor aproveitamento, mas que prejudicou o seu atraente aspecto externo. Nem sempre é fácil juntar o útil ao agradável. Efectivamente, a FOZ DO DOURO foi equipada com dois motores diesel Fairbanks de 650 bhp, o que implicou a instalação de uma chaminé bastante larga, pintada de cor amarela, e por desnecessárias foram retiradas as vergas e pau do gurupés, transformando a antiga barca numa embarcação estranha com pouco ar de navio de velas mas também com poucas semelhanças ao navio-motor de carga tradicional, apesar da sua configuração a um lugre de quatro mastros, ostentando apenas duas vergas sem qualquer funcionalidade, e assim terminou sua gloriosa carreira como navio à vela.

O navio-motor FOZ DO DOURO ao demandar o porto de Leixões, década de 50 / Foto Mar - Leixões /.

Continuou a navegar como navio-motor, tendo sido transferida em 11/03/1952 para o seu novo armador, a Sociedade Industrial Ultramarina, contudo registada na capitania de Bissau, e mais uma vez em 15/11/1955, passa para o seu décimo primeiro armador a firma Silva & Dias, Lda. Em 1956 é de novo desactivada, ficando amarrada na doca de Pedrouços, Lisboa, tendo o seu registo sido cancelado em 04/05/1957, como resultado da sua venda à Sté Anonyme Bonita, Tanger, que fez rumar aquele navio-motor a La Spezia, Itália, onde foi desmantelado para sucata, 65 anos após o seu lançamento ao mar.
Resta acrescentar, que a única passagem da FOZ DO DOURO pelo rio Douro, julga-se ter sido em 09/1949, apesar de matriculada, por bastantes anos, na praça da cidade do Porto, e da sua tripulação fizeram parte vários elementos das zonas ribeirinhas do Porto e Matosinhos, entre os quais José Teixeira Lencastre, natural e residente na terra, que deu o nome àquele famoso navio, que foi seu oficial, e em 1955 candidatou-se e foi admitido como piloto da barra dos portos do Douro e Leixões.
Fontes: José Fernandes Amaro Júnior, Lloyd’s Register of Shipping, Lars Bruzelius, Matson Lines, Imprensa diária.
(continua)
Rui Amaro

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